Ponto-final: A guerra de Bolsonaro contra a democracia | política| opinião

Atualmente, vivemos um desafio muito grande na política brasileira: algo que muitos dizem que explodiu a partir de 2013, mas com raízes anteriores. Vivemos tempos de ameaças contínuas à nossa democracia; ameaças negadas por alguns, e aceita por outros; no livro “How Democracies Die” por Daniel Ziblatt and Steven Levitsky, apresenta-se os elementos que podem derrubar democracias no contextos recentes, e alguns parecem existir no Brasil; um exemplo é tentativa contínua do governo em atacar o sistema (as instituições em geral)de forma aleatória, sem uma estratégia clara.
No livro “Tormenta: O governo Bolsonaro: crises, intrigas e segredos”, Thaís Oyama comenta sobre a estratégia de Bolsonaro para ganhar a presidência: 90% de redes socais; Trump, “o guru de Bolsonaro”, usou estratégias similares; o livro Daniel Ziblatt e Steven Levitsky foi escrito nesse contexto de ameaça à democracia americana. Como uma pessoa conseguiu usar uma rede aparentemente tão inofensiva para ser eleito presidente da república? Não é desconhecido os problemas com os algoritmos das redes socais. Como exemplo, Cathy O’Neil em “Weapons of Math Destruction” destaca como empresas como Facebook não deixam o público ter acesso aos seus algoritmos, que tem sido mostrado que usam do ódio nas redes sócias para ganhar atenção, até mesmo seguindo linhas racistas; em “Let’s design social media that drives real change”, Wael Ghonim mostra como usou as redes sociais para iniciar uma revolução democrática no Egito, e como essa mesma arma voltou contra os interesses da nação. O que tudo isso tem a ver com Bolsonaro? Existem fortes evidências de que ele usou essas táticas, hoje conhecido como “gabinete do ódio”, e sobe investigação no STF; como exemplo desse tipo de tática, no dia 28 de Junho de 2020, o bot Sentinel, que identifica contas não autêntica, ou seja, robôs, identificou 366 tweets mencionando #GOBOLSONAROMUNDIAL no momento que entrei no Twitter, na tentativa de rebaixar a hashtag mais falada no momento (#StopBolsonaroMundial, movimento real que aconteceu em todo o mundo contra Bolsonaro).
Marcos Nobre em ‘Ponto-final: A guerra de Bolsonaro contra a democracia’, que será o foco desse ensaio, procura estudar o Brasil fora das redes sociais, mas as redes sociais são apenas o reflexo de uma sociedade; como exemplo, a política para barrar o gabinete do adio já passou no congresso (PL 3063/20), contra as fake News, mas será se realmente vai resolver? A raiz do problema parece ser na sociedade. O que está por traz de tudo isso? Qual o objetivo do governo Bolsonaro? Uma das teses de Nobre é que Bolsonaro não é louco, e deve ser levado a sério, mais precisamente, ser tratado como um político, que é o que ele é de verdade, e foi durante mais de 30 anos antes de ser eleito presidente da república; curiosos podem ler vários livros, entre eles o de Thaís Oyama.
Nas palavras de Nobre: “Destruir as instituições democráticas pela via eleitoral tornou-se possível no Brasil porque elas foram identificadas ao ‘sistema’”. Ao passo que Daniel Ziblatt e Steven Levitsky destacam que nos tempos atuais, a democracia, como na Hungria, Polônia e Venezuela, foram destruída exatamente dessa forma, “de dentro”; as pessoas que deveriam defender a democracia foram exatamente quem as destruiu; como o vírus da AIDS, que desativa as defesas do corpo, o deixando vulnerável a qualquer doença. Como destaca Jessé Souza em suas inúmeras palestras e obras, Bolsonaro se colocou como ‘antissistema’, e como destaca Nobre, um político antissistema não tem como governar por não ter experiência e nem poder buscar pessoas com experiência dentro do governo sem correr o risco de se colocar no sistema (note os ministros, em especial da Educação, desastre total): sendo assim, Bolsonaro nunca vai governar, e se governar, vai cair em uma contradição e pode afastar seus apoiadores mais radicais, curiosamente chamados de Bolsominions desde que foram descobertos.
Precisamos separar a política criada nos últimos anos (“política de coalisão”), que gerou toda essa bagunça na democracia (criada com a constituição de 1988); o sistema político se impregnou no sistema democrático como parasita, mas para matar o parasita não podemos correr o risco de matar o hospedeiro, que é a democracia, o mesmo que nos mantém livres. Não podemos cair na ladainha atual de que precisamos destruir o sistema democrático para matar os parasitas. O mais interessante de se notar nas redes sociais, que é a extensão mais clara das pessoas militantes, é que as pessoas estão lutando pelo que já existe. Na foto abaixo, tirada do Twitter, temos um grupo lutando por algo que já existe: os ministros do STF são indicados pela presidência, qualquer pesquisa na internet revela isso, o ministro Barroso declara em entrevistas que foi nomeado pela então presidente Dilma Rousseff; e Bolsonaro está usando o cargo no STF que pode ser criado para os próprios interesses. Segundo o Ministro Britto, a constituição não foi emendada inúmeras vezes desde 1988 pelo o que ela peca, mas sim pelo que tem de bom; ou seja, como na foto abaixo, as pessoas reivindicam o que já tem! Esse é o estilo Bolsonaro, como destaca Mandetta em entrevista, como deputado, Bolsonaro perguntava a opinião dos outros antes de votar: seu papel era de ser contra. Isso pode funcionar para um deputado que tem de representar um pequeno grupo, não funciona para presidente, que deve governar para todos, inclusive para quem não votou nele; eu não votei no Lula nem na Dilma, mas pude fazer doutorado no exterior graças aos programas deles.

Como acrescenta Nobre: “Bolsonaro nunca pretendeu governar para todo mundo. Para ele, quem diz que governa para todo mundo mente e engana, faz ‘velha’ política.” Essa parte é importante por que como destaco anteriormente, os presidentes em geral governam para todos. Como Nobre destaca em palestra, Bolsonaro nunca falou no seu discurso para os pobres, que são a maioria no país e por ironia são os que mais sofrem atualmente, mesmo funcionários públicos votaram em Bolsonaro, agora podem perder privilégios. Como destaca Jessé Souza, políticos como Bolsonaro usam o ódio das pessoas para se elegerem sem dar nada em troca, somente uma direção para colocarem seu ódio, como o mesmo destaca, direção errada. Como Jessé destaca em palestras, apesar da corrupção ser algo importante de ser combatida, houve um excesso de foco na corrupção dos políticos, esquecendo por exemplo dos “saques da população” que os bancos fazem com a maior taxa de juros do mundo sem justificativa para tal; Dilma tentou atacar essas taxas, mas comprou briga com “cachorro grande”, os grandes bancos; atualmente sendo defendidos por Paulo Guedes, o que ficou claro na reunião ministerial que foi divulgada por decisão do STF.
Nas palavras de Nobre: “Bolsonaro venceu a eleição de 2018 porque conseguiu canalizar para sua candidatura a devastação social e institucional das crises sobrepostas que nos afligem desde 2013.” A questão mais importante de se notar é que o mesmo continua usando essa energia, videm à reunião ministerial divulgada por ordens do STF. O mais interessante é que Bolsonaro tenta usar a mesma energia mesmo para assuntos internacionais, onde a postura do Brasil tem sempre sido diplomática, tendo como exemplo o BRICS e acordos recentes com a União Europeia.
Algo interessante que Nobre ressalta, mesmo em palestras é: “Desde que Bolsonaro assumiu, o governo funciona apesar de seu presidente.” Na visão do mesmo, Bolsonaro, como outros líderes antissistema, que conseguiram implementar o fim da democracia, abusam do funcionamento do sistema tanto ao seu benefício quanto para exaltar a própria imagem. Exemplo recente é o auxílio emergência, que foi algo conquistado pelo congresso, que se dependesse do Paulo Guedes nunca sairia, mas Bolsonaro em momento oportuno rouba para si; em artigo Thaís Oyama comenta que o que segura Bolsonaro no poder agora é o auxílio emergencial, que ele mesmo atacou; sua popularidade caiu e subiu exatamente na classe que recebe esse auxilio.
Um dos discursos que ouvi para se votar no Bolsonaro era comparação com os Estados Unidos, se Trump foi eleito lá e a economia melhorou, isso implicaria, na cabeça de muitos, que Bolsonaro seria uma boa para o Brasil. Nas palavras de Nobre. “Bolsonaro não é Boris Johnson nem Donald Trump, mesmo se usa táticas semelhantes às deles.” Algo interessante notado por Nobre no seu livro é que para esses dois casos, mesmo outros em todo o mundo temos algumas diferenças: i) eles se converteram quando a coisa ficou preta devido a suas posturas com relações ao COVID, Bolsonaro insiste em tratar o caso da pandemia como uma “gripezinha”, mesmo seus seguidores se comportam assim; ii) a popularidade dos mesmos melhorou recentemente, a de Bolsonaro continua caindo.
“o núcleo duro de apoio a Bolsonaro que podemos por boas razões identificar ao núcleo autoritário tem a dimensão aproximada de 12% do eleitorado.” Essa passagem é interessante por que estima esse núcleo que está com Bolsonaro para o dê e vier; os resto, em torno de 20%, parece está pouco a pouco se dissolvendo. O número de “bolsominions arrependidos” tem aumentado a ponto de celebridades darem entrevistas: como caso de Lobão no Roda Vida; ver vídeo interessante no canal TV Afiada (https://www.youtube.com/watch?v=nRHTxpQcauA); o mais interessante dessa discussão na TV Afiada é que muitas pessoas se disseram enganadas; teria como enganar uma pessoa bem informada como Luciano Huck? Talvez sim, talvez não; vejo o caso da Marina que apoiou Aécio Neves, e depois voltou atrás.
É da natureza humana hostilizar, colocar em categoria, como dizia Marshall Rosenberg no contexto da comunicação não violenta: A vantagem de se falar com as pessoas são os diagnósticos de graça. Isso na política pode ser ainda mais perigoso. Como destaca Nobre: “hostilizar a parcela do eleitorado que não votou em Haddad em 2018 ou que escolheu Bolsonaro, mas se arrependeu, é o mais vistoso dos presentes que o atual presidente pode receber.” Bolsonaro e turma se alimentam disso, de crises, de instabilidade. Isso escode o fato de que eles não sabem o que estão fazendo. O inteligente, revolucionário, e o idiota, a princípio são os mesmos, os dois desafiam a realidade, mas somente um traz solução, o outro traz problemas.
O inteligente, revolucionário, e o idiota, a princípio são os mesmos, os dois desafiam a realidade, mas somente um traz solução, o outro traz problemas.
Em um conjunto de Tweets, Yahoo News mostrou os símbolos nos protestos recentes: tinha até símbolo da revolução Ucraniana (isso antes da guerra atual!). Na casa do advogado da família Bolsonaro foi achado símbolos nazista e AI-5. Sendo assim, Nobre destaca: “Abrir os olhos para as sutilezas e para as diferentes motivações implica abrir mão de demonizar parcelas do eleitorado como inapelavelmente conservadoras e autoritárias.”
Jessé Souza bate muito na tecla de que a corrupção foi usada pela classe média como forma de tirar o foco do verdadeiro problema: sistema de privilégios e da política em si.
Como destaca Nobre “A resposta da política oficial ao colapso institucional foi lançar mão da tática do boi de piranha. Em 2016, entregou o boi enfraquecido e desgastado do PT ao lavajatismo para tentar passar o resto da boiada em outro ponto do rio.” Como acabo de saber, agora, até mesmo o FBI estava por traz da Lava Jato. Seria realmente corrupção o motivo da Lava Javo? Você já viu governo americano ajudar alguém? Olha o que fizeram com os países que meteram a mão devido a interesses nas riquezas. Hoje o Brasil, através do Bolsonaro, “está de quatro” para os Estados Unidos; depois dizem que o leão é ruim, quem caça acha, quem não faz gol toma!
Para fechar, uma das passagens que mais me deixou pensando, e ainda deixa: “será que essa morte poderia ter sido evitada se não fosse a irresponsabilidade e a desumanidade de Bolsonaro com a população de seu próprio país?” Pergunta Nobre com relação à conduta de Bolsonaro na pandemia: 2 ministros demitidos. Entrevistas mostram que Mandetta tinha um plano sólido para a Saúde do SUS, especialmente na pandemia; além de demostrar ser uma pessoa cautelosa, essencial para esse momento de nervos quentes.
Como destaco em outro artigo, pessoas em geral acham que sabem tudo de política, fato curioso que não ocorre com a física; é possível que temos um exemplo claro do efeito Danny-Kruger, que basicamente é uma armadilha cognitiva no qual quanto mais ignorante for alguém maior sua confidência no que pensa.
Eu leio vários livros em paralelo, e muitos não termino, mas esse não consegui parar de lê. De um lado temos o momento tenso no Brasil, do outro temos a mídia em geral bombardeando as pessoas com informações, fazendo seu trabalho, como diz o Ministro Britto, não podemos impedir a mídia de falar primeiro, nem o STF de falar por último. Penso que somente alguém que acompanha tudo isso há anos, como um cientista político, pode fazer sentido de tudo isso. Esse é o fato central que me motiva a ler em um momento que muitos preferem formar opiniões. Ainda não tenho uma opinião formada de nada na política, não consigo falar se o judiciário deveria ou não interferir no executivo, mas a opinião de especialistas como Marcos Nobre, como o ponto de vista desse livro, e caso eu tenha de me posicionar, na dúvida, vai o pensamento de um especialista! Para finalizar: recomendo a leitura por ser prática, como o livro foi publicado recentemente, o autor traz fatos relevantes e recentes no livro, isso para mim é sensacional!
Nota do autor. Este ensaio é uma leitura da obra ‘Ponto-final: A guerra de Bolsonaro contra a democracia’ por Marcos Nobre.
Alguns detalhes técnicos. O livro tem 80 páginas, sendo 57 de texto principal e o restante de anexo e similares. O livro segue o formato de uma grande redação, sem sessões, somente separação por parágrafos. É ideal para leitura de uma vez só devido ao tamanho e formato. Levei 1–2 semanas para ler, lendo um pouco por dia. O livro tem uma levada bastante prática, sem necessidade de grandes conhecimentos de política e raciocino para leitura, ideal para iniciantes nos estudos políticos.
Discussão do livro
(*) cont.
Gostaria de aproveitar para fazer uma reflexão sobre o método científico, abordado na minha obra “Introdução à pesquisa científica: Aprenda sobre a pesquisa científica, e como ela pode ser parte da sua carreira”
Acredito que a pessoa queria que eu somasse 2+2=4.
Seria possível fazer isso em áreas como história e sociologia?
Acredito que não. O que aprendi, tanto lendo quanto nas discussões de Facebook que inspirou o livro, é que o método científico é bem rico. Ciências como a física e matemática gozam deste prazer, de “ter certeza”.
Nesse caso da imagem, concluir baseado no momento, e concordo que posso ter errado. A história é revista continuamente, por ser algo “interpretativo”.
Pensei assim:
Bolsonaro ataca a democracia em comício, verbalmente-> seguidores pedem a remoção do STF e colocar o presidente como supremo -> resultado do Bolsonaro.
Concordo, posso ter errado. Mas qual seria a alternativa para interpretar eventos como da política? precisaríamos de uma ditadura para prever a ditadura? Seria necessário bater a cara para prever a parede? São somente reflexões! Não leve para o lado pessoal! Vamos fazer ciência sem ofensas, please.

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#forabolsonaro2022